quarta-feira, 26 de março de 2014
Onde estão as Moedas
Pintura de Lasar Segal
Conto: Onde estão as Moedas?
As Chaves do vínculo entre
pais e filhos.
“Numa noite qualquer, uma
pessoa, da qual não sabemos se é um homem ou uma mulher, teve um sonho, um
sonho com os pais”.
Neste sonho seus pais
apareciam e lhe davam algumas moedas, não sabemos quantas eram, se uma dúzia ou
uma centena, nem de que metais eram feitas, se eram de ouro, de prata, de
cobre, de ferro ou mesmo de argila.
O sonhador as recebia de bom
grado porque eram as moedas que seus pais lhe davam, eram as exatas que necessitava
e merecia, para levar sua vida. Satisfeito agradeceu aos pais pelas moedas
recebidas tomando-as por inteiro.
E o sonhador (a) termina a
noite de sono tranquilo (a), descansado e pleno. Ao amanhecer, desperto bem
disposto e resoluto em ir à casa dos pais para comentar o sonho e agradecer as
moedas recebidas.
Indo até os pais, comenta o
sonho e agradece as moedas recebidas, em profunda gratidão. Seus pais, vendo a
atitude do filho (a), sentem-se grandes, ainda maiores e mais bondosos do que
haviam sido e orgulhosos do filho (a). Dizem-lhe então:
Estas moedas são para você,
use-as como quiser e não precisa devolvê-las, é nossa herança para você.
E este filho (a) segue seu
caminho satisfeito e pleno, capaz de enfrentar e vencer qualquer desafio, com a
certeza de haver recebido as exatas moedas que necessitava e merecia de seus
pais, suficientes para empreender sua caminhada. De tempos em tempos volta-se
para trás, em direção à casa dos pais, e sente-se revigorado e pleno para
seguir e realizar sua vida.
Acontece que em outra noite
qualquer, outro sonhador (a) tem um sonho parecido, que costuma acontecer com
qualquer um de nós, mais cedo ou mais tarde, de ter um sonho com os pais. Neste
sonho, o sonhador (a) recebe dos seus pais algumas moedas, que não sabemos se
uma dúzia, uma centena ou apenas umas tantas, nem de que metal eram feitas, se
de ouro, de prata, de cobre, de ferro ou mesmo de argila.
Mas este sonhador não aceita
as moedas dos pais.
Estas não são as moedas que
necessito, preciso e mereço, por isto não as tomo e deixo-as com vocês. Se eu
as tomasse minha vida se tornaria pesada e, portanto, fiquem com elas.
E este sonhador (a) segue
pela noite intranquilo, com o sono entrecortado e desperta muito cedo, cansado
e ansioso por ir até a casa dos pais, contar-lhes a respeito do sonho.
Lá chegando, diz aos pais
sobre o sonho e que aquelas moedas não lhe interessam, que aquilo que eles
tinham para ele não eram as moedas que ele (a) necessita e merece, deixando-as
portanto com eles.
Os pais ouvindo isto tornam-se
ainda menores, humilhados, como costuma acontecer quando um filho (a) não toma
seus pais, seus ensinamentos e sua herança, tal como foi; e retiram-se para seu
quarto.
E este (a) sonhador (a),
tomado de uma estranha força, sente-se fortalecido e vingado, havendo acertado
as contas com seus pais, e sai para a vida decidido a encontrar suas moedas, as
que justo necessita e merece. Com alguém elas devem estar.
E tomado por esta força,
estranhamente falsa, vai pela vida em busca de parceira (o), procurando pelas
moedas que necessita e crê poderem estar com ela (ele). Às vezes tem a sorte de
encontrar alguém e mais sorte ainda desta relação durar algum tempo.
Quando isto ocorre, com o
passar do tempo o sonhador (a) percebe que sua (seu) parceira (o) não tem as
moedas que necessita e merece, e o relacionamento perde todo seu encanto,
ficando para trás. E o sonhador (a) segue em busca de outra pessoa que talvez,
desta vez, tenha as suas moedas.
E de relacionamento em
relacionamento, segue em busca de suas moedas e desencantos, porque nenhum
deles tem as moedas que necessita e merece.
Outras vezes, o sonhador (a)
tem um filho (a) e, ao engravidar, cria a forte expectativa de que este filho
(a) terá as moedas que necessita e merece, e o (a) aguarda ansioso (a) e cheio
(a) de esperanças. Mas a vida é como é; os filhos crescem e seguem seus
próprios caminhos, e tampouco eles têm as moedas que o pai ou a mãe procuram.
E nesta busca incessante, o
tempo vai passando até que o desespero toma conta: onde estarão minhas moedas,
justo as que necessito e mereço para levar minha vida.
Então, algumas vezes, vão a
busca de um terapeuta, na certeza de que eles sim saberão das moedas.
Mas há dois tipos de
terapeutas: um que acredita que tem as moedas que seu cliente procura; e outro
que sabe que não as tem, mas está disposto a ajuda-lo a procura-las.
Quando tem a sorte ou a
sabedoria de encontrar este segundo tipo de terapeuta, dá-se início a um
processo de autoconsciência e aprendizado, aonde o sonhador (a) vai percebendo
aspectos antes ignorados, apropriando-se de sua própria vida, pouco a pouco.
Até que num belo dia o
terapeuta se dá conta de que o sonhador (a) já está pronto para saber onde
estão suas moedas. E neste mesmo dia, não apenas por coincidência, o sonhador
(a) vem para a terapia e diz:
- Eu já sei onde estão as
moedas. Ainda estão com os meus pais.
E resoluto (a), empreende o
retorno à casa dos pais, em busca das justas moedas que necessita e merece.
Chegando à casa dos pais,
arrependido (a) e amadurecido (a), toma-os por inteiro, tal como foi, aceitando
feliz e de bom grado as moedas que eles tem para si, exatamente as que precisa,
necessita e merece para levar sua vida em plenitude.
E seus pais, reconhecidos e
aceitos inteiramente pelo filho (a), tornam-se ainda maiores, mais dignos e
responsáveis, podendo ser ainda mais generosos. E assim, o sonhador (a)
encontra seus caminhos, com a fortaleza da herança dos pais: agradecendo a vida
recebida; dizendo sim a tudo, tal como foi, libertando-se de todas as mágoas, deixando
as responsabilidades com quem de direito; e tomando sua própria vida em suas
mãos, com a benção de seus pais, para que, agora possa buscar sua
felicidade."
Joan Garriga Bacardi
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